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Diária

“A Mealhada é uma cidade incrível à qual sou muito grato”


quarta, 10 julho 2019

Chama-se Tavares Morais Taimo, é moçambicano, tem 21 anos e vive na Mealhada desde 2015. No final deste ano, tenciona regressar a Moçambique, mas apenas para gozar uns dias de férias: “estou bem aqui, por isso não quero mudar”.

Tavares nasceu em Manica, uma província situada no centro de Moçambique. Perdeu a mãe aos 12 anos, não tem recordações do pai e foi criado pela avó. Tinha 17 anos quando concluiu o Curso de Carpintaria e Marcenaria na Escola Profissional de Chimoio. “Fiz uma pausa nos estudos porque não tinha condições económicas para continuar. Comecei a trabalhar aos 18 anos – primeiro na escola onde estudei, como auxiliar, e, posteriormente, numa carpintaria – para juntar algum dinheiro e depois poder voltar a estudar”, conta o jovem. Quando soube que tinha sido um dos dez alunos selecionados para uma bolsa de estudo da Fundação Portugal África, em março de 2015, que lhe daria a possibilidade de concluir o curso de Técnico de Gestão na Escola Profissional Vasconcellos Lebre (EPVL), na Mealhada, ficou “muito feliz”. “Deus estava ao meu lado e deu-me esta grande oportunidade”, conclui.

Nesta altura, Portugal era para Tavares um país “qualquer”, que sabia situar no mapa-múndi e que tinha Lisboa como capital (“aprendi nas aulas de Geografia”). O jogador de futebol português Cristiano Ronaldo também lhe era familiar, assim como os escritores Luís Vaz de Camões e Fernando Pessoa, que lhe foram apresentados em aula. Sobre a Mealhada, nunca tinha ouvido falar, mas, assim que começou a tratar de questões burocráticas relacionadas com a bolsa, logo lhe disseram que era terra de leitão.  

Foi em outubro de 2015 que aterrou no Porto. À sua espera, no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, estava Nuno Canilho, gerente da EPVL. “Ter sido recebido por uma pessoa tão importante foi uma honra”, recorda, acrescentando que se sentiu protegido e apoiado desde o primeiro momento.

“Nunca me faltou nada”

A adaptação à escola, à cidade e ao país foi “difícil”. Tavares estranhou principalmente o clima e o “sotaque”. As “excelentes” condições da escola e da residência que lhe foi atribuída surpreenderam-no pela positiva. O jovem moçambicano elogia também o apoio e a simpatia de professores, colegas e funcionários da escola, dos vizinhos e da população da Mealhada em geral. “Nunca me senti sozinho e nunca me faltou nada”. Sem esta ajuda – garante – não teria conseguido concluir o 12.º ano.

Tavares Taimo, que é sapador florestal da Fundação Mata do Bussaco há sete meses, podia ter regressado a Moçambique no ano passado, mas não quis. “Quando vim para cá, era uma criança, não sabia bem o que queria da vida. Nestes três anos, renasci: mudei muito a nível académico, profissional e pessoal. Penso de outra forma e encaro a vida de maneira diferente. Agora sei o que quero e sei também que sou capaz de atingir os meus objetivos”. Concluir o 12.º ano foi uma meta alcançada. Ingressar no ensino superior, enquanto trabalhador-estudante, no Curso de Gestão de Pequenas e Médias Empresas, é o passo seguinte.

Na Mealhada – “cidade incrível à qual sou muito grato e que pode contar comigo para tudo” – Tavares Taimo é “muito feliz”, respeitado e acarinhado por várias “famílias”: “tenho a família da EPVL, que é muito especial e a quem devo muito; tenho a família da igreja (a religião faz parte da minha vida desde a infância); tenho a família do trabalho; tenho a família dos amigos; e tenho a família dos bombeiros – sou bombeiro voluntário estagiário”. A família que deixou em Moçambique faz também parte do dia-a-dia de Tavares: “falo todas as semanas com a minha avó e as minhas duas irmãs”. Saudades – de quem se despediu há mais de três anos, em Manica – é palavra que “descarta” da vida “para não atrapalhar”. “Aqui também me sinto em casa”, diz, sorridente, o jovem que todos os meses manda poupanças para Moçambique, para ajudar a pagar os estudos das irmãs mais novas. “Sou rigoroso com elas. Incentivo-as a continuar a estudar porque vale a pena”. Além disso, acrescenta, “quero fazer com elas o que fizeram comigo em Portugal e, em especial, na Mealhada”.