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Diária

“É um sonho tornado realidade”


quarta, 02 outubro 2019

Na Mealhada é fácil encontrar o leitão assado e, na Nova Casa dos Leitões, é fácil encontrar o Josias Borja dos Santos, com 27 anos, e já há 8 em Portugal. Quando questionado sobre as datas, o são-tomense diz o dia e o mês com facilidade e exatidão.

6 de dezembro de 2011 foi o dia em que veio para Portugal e Josias explica que “veio para estudar” e acabou por ir para uma escola em Mortágua. O tio, “que, infelizmente, já partiu” foi uma ajuda importante no processo para vir para Portugal.

Segundo explica, “o processo de emigração não foi fácil”, e esteve “2 anos à espera para vir para Portugal”, visto em São Tomé quererem garantir que Josias não ficava “em desamparo”. O tio, que fazia várias viagens entre Portugal e São Tomé e Príncipe por motivos profissionais, assegurou que o jovem ficava em boa companhia. Assim, era exigido um termo de responsabilidade e também um documento da escola que comprovasse que o são-tomense iria fazer a sua formação em Portugal. É por este motivo que Josias explica que “é muito raro encontrar um são-tomense sem documentos oficiais”.

Aliado a este processo, Josias fala também do “choque” que foi chegar a Portugal, visto ter chegado em dezembro, altura em que, em São Tomé e Príncipe, faziam “30 graus e cá fazia 0 ou 1, 3, ou até, 6 graus”, “só frio”, conta a rir.

A viagem para a Mealhada desde Mortágua deveu-se a “alguns amigos da igreja que me convidaram para vir”, e é com a mesma exatidão e memória que Josias indica que começou a trabalhar na Nova Casa dos Leitões, a 23 de outubro de 2014.

Josias explica que, após concluir os estudos, procurou um trabalho, de forma a assegurar a sua independência, e pediram-lhe, no restaurante, um documento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que assegurasse que podia trabalhar em Portugal. O são-tomense dispôs-se a ir buscar o documento, mas, no SEF, pediram-lhe uma promessa de contrato ou um contrato de trabalho para lhe ser fornecido o documento. Ora, Josias não tinha nenhum dos dois, mas sabia que tinha trabalho.

A situação parece uma piada, mas, segundo explica, tudo ficou resolvido com a emissão de um recibo verde, e assim comprovou ao SEF que, de facto, tinha trabalho, podendo receber assim o dito documento, e assinar o contrato de trabalho.

Em relação à Mealhada, afirma que gosta da tranquilidade e sente que há “muita qualidade e oferta de trabalho”, afirmando até que já recebeu vários convites para morar em Lisboa, de parentes que moram na capital. Já aproveitou o tempo que passou em Portugal também para visitar o Porto - “gostei muito” - e também já foi à Serra da Estrela, num período em que morou em Gouveia durante um mês.

“Os portugueses são mais responsáveis”

Ao olhar para o seu país de nascimento, Josias afirma que já teve “a possibilidade de voltar”, mas o país “não tem estabilidade económica para voltar”. No entanto, explica que desde que nasceu “não assistiu a uma guerra sangrenta em São Tomé e Príncipe”, e isso é muito positivo, tendo em conta o estado de algumas zonas de África em que se “está a sofrer fome devido às guerras”.

Segundo afirma, tem acompanhado algumas notícias e indica: “o meu país sofre um período de crise há algum tempo”. Parte dessa crise também se deve ao facto que “não há correspondência entre o poder político e o povo. O povo espera atividade do governo e o governo espera o mesmo do povo”.

A última vez que visitou São Tomé foi em 2016 e Josias dos Santos explica que isso se deve ao preço da viagem, mas valeu a pena. “Em termos de convivências é incomparável”, é quase como se fossem “todos primos”, e o são-tomense dá um exemplo: “se alguém comete um crime todos acabam por saber quem foi”, e até no que toca a passar dificuldades, todos dão apoio, conforme afirma.

No entanto, apesar da convivência que sente existir, Josias afirma que “os portugueses são mais responsáveis” e lembra que “em São Tomé, marca-se uma coisa e depois passa uma pessoa à frente”.

Já com um filho de 2 anos, Josias afirma que “é um sonho tornado realidade” morar em Portugal, e já começou o processo para obter a nacionalidade portuguesa, tendo contactado os familiares em São Tomé e Príncipe para “ter dois documentos que faltam”.

O são-tomense aconselha os compatriotas a imigrarem para Portugal, mas é entre risos que apresenta a condição: “desde que a responsabilidade não caia em cima de mim”. Josias sente que “Portugal é um bom país para viver” e é com a companheira e com a vontade de “continuar em frente” que pretende aproveitar a experiência em solo lusitano.